Texto de Claudio Naranjo, psiquiatra chileno
A problemática da Educação não é de nenhuma maneira o que parece ser para a maioria dos educadores. Acredita-se que os estudantes não querem mais o que lhes é oferecido. As pessoas na verdade querem força-los a uma educação irrelevante e eles se defendem com transtornos de atenção e com desmotivação. Penso que a educação não está a serviço da evolução humana e sim à produção. Esta educação está servindo para domesticar pessoas, de geração em geração, para que sigam sendo cordeiros manipulados pelos meios de comunicação. Isto é socialmente um grande perigo. Procura-se usar a educação como uma maneira de meter na cabeça das pessoas um modo de ver as coisas como convém ao sistema, à burocracia. Nossa maior necessidade é a de uma educação para evoluir, para que as pessoas sejam o que elas poderiam vir a ser. A crise da educação é uma crise a mais entre as muitas crises que temos. O mundo está em uma crise profunda porque não temos ainda uma educação para a consciência. Temos uma educação que de certo modo está roubando das pessoas a consciência, o tempo e a vida. O modelo econômico de hoje tem anulado o desenvolvimento da pessoa.
Como seria a educação para que sejamos seres completos?
A educação ensina as pessoas a passarem em exames e não a pensar em si mesmas. Em um exame não se mede a compreensão, se mede a capacidade de repetir. É ridículo, se perde uma quantidade tão grande de energia. Em lugar de uma educação para informação, se necessitaria uma educação que se ocupe do aspecto emocional e uma educação da mente profunda. Tenho para mim que estamos presos entre uma alternativa, que é a educação laica e uma educação autoritária que é a educação religiosa tradicional. Esta bem em separar a Igreja do Estado, porém isto tem colocado a margem o Espirito como se Religião e Espirito fossem a mesma coisa. Necessitamos de uma educação que atenda também à mente profunda.
Quando falas de espiritualidade e de mente profunda a que te referes?
Isto tem relação com a consciência mesmo. Tem que ver com aquela parte da mente da qual depende o sentido da vida. Estamos educando as pessoas sem este sentido. Tão pouco é a educação de valores porque a educação de valores é demasiada retorica e intelectual. Os valores deveriam ser cultivados através de um processo de transformação da pessoa e esta transformação está muito longe da educação atual. Desenvolver-se como pessoa não pode se separar do crescimento emocional. Os jovens estão muito prejudicados afetiva e emocionalmente, pelo fato de que o mercado de trabalho absorve seus pais e estes já não tem disponibilidade para os filhos. Há muita carência amorosa e muito desequilíbrio nas crianças. Não pode aprender intelectualmente uma pessoa que está com dificuldades emocionais. O mundo civilizado é um mundo domesticado e a aprendizagem e a criança são instrumentos desta domesticação.
À educação só interessa desenvolver a parte racional das pessoas. Que outras coisas poderiam se desenvolver?
Ponho ênfase em que somos seres com três cérebros: temos cabeça (cérebro intelectual) coração (cérebro emocional) e víscera (cérebro visceral e instintivo). A civilização esta intimamente ligada à tomada do poder pelo cérebro racional. No momento em que os homens fizeram prevalecer o domínio politico, uns 6000 anos atrás, se instaurou isto que chamamos de civilização. E não é somente o domínio masculino nem o domínio da razão, é também o predomínio da razão instrumental e prática que se associa com a tecnologia; é neste predomínio da razão instrumental sobre o afeto e sobre a sabedoria instintiva que temos nos empobrecido. Se vamos educar uma pessoa, temos de ter em conta que ela não é somente intelecto-razão. É preciso uma educação para seres tri-cerebrais. Uma educação que poderíamos chamar de holística onde o ser é visto de uma forma integral. Ao sistema interessa que a pessoa não esteja em contato consigo mesma, nem que pense por si própria. Por muito que se levante a bandeira da democracia, se tem muito medo que as pessoas tenham voz e tenham consciência. A classe politica não está disposta a apostar na educação.
A educação tem nos afundado em um mar de conceitos que nos separam da realidade e aprisionam nossas mentes. Como sair desta prisão?
Esta é uma pergunta importante no mundo educacional. A ideia de que o nível conceitual seja uma prisão requer certa experiência de que a vida é mais que isto. Para aqueles que já têm uma necessidade de sair da prisão do intelecto, é muito importante a disciplina de deter a mente, a disciplina do silêncio como se pratica em todas as tradições espirituais seja cristianismo, budismo, yoga, xamanismo.
O diálogo interno em todas as tradições de desenvolvimento humano têm sido visto como algo importante. A pessoa precisa se alimentar de outras coisas que não conceitos. A educação na verdade quer encerrar as pessoas em um lugar onde ela esta restrita a uma educação conceitual forçada, como se não houvesse outra coisa na vida. É muito importante, por exemplo, a beleza. A capacidade de reverencia, de assombro, de veneração, de devoção. Isto não tem que ver necessariamente com religião ou com um sistema de crenças. É uma parte importante da vida interior que se está perdendo da mesma maneira em que se estão perdendo os espaços belos da superfície da Terra, a medida que se constrói e se urbaniza.
A crise ecológica é muito evidente, é a ameaça mais tangível de todas. Pode-se prever que com o esquentamento da Terra, com o envenenamento dos oceanos e outros desastres que estão acontecendo. Estamos vivendo graças ao petróleo e sem esse combustível haverá uma crise no mundo tecnológico que temos hoje.
As pessoas que chamamos mais primitivas como os indígenas tem uma forma de tratar a natureza que não vem do sentido utilitário. Na ecologia como na economia e em outras tantas coisas temos tentado prescindir da consciência e a funcionar somente com argumentos racionais e isto nos está levando ao desastre. A crise ecológica só poderá parar com uma mudança do coração, verdadeira transformação, que só poderá se dar através de um processo educativo. Por isso necessitamos estar em muita sintonia com nossa experiência do momento. Não estamos em nós mesmos, não estamos atentos a quem somos. Estamos vivendo o aspecto horizontal da vida, porém pouco atentos ao aspecto vertical, o aspecto mais alto e mais profundo, isto é o Espírito, e a chave para ascender é o aqui e agora.
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